terça-feira, 13 de dezembro de 2011

DRAMA NO CANIL

Alegrei-me imensamente. Minha husky, a Loba, estava prenhe. Popular, a mascote passeava por todo o colégio, recolhendo as migalhas deixadas pelos alunos nos recreios. Não raro, ganhava sanduiches inteiros de pernil ou frango. A criançada ama os animais. E a notícia se fez notória e a coisa só melhorou pra ela. Engordara e seu pelo ficara bem mais sedoso.


Dias antes do nascimento das crias, ela começou a preparar sua cama na juntura de dois prédios. Os zeladores, em polvorosa, acharam aquele vão demasiado estreito e fundo. Impossível, depois, cuidar dos filhotes (e pegá-los no colo, claro estava). Marcos pediu-me permissão e a levou abraçadinha para sua despensa. Dócil, ela foi sem protestar. Horas mais tarde, fui chamado pra vê-la lambendo serena os quatro filhotes, todos machos. Traziam na testa a típica flor-de-lis. O primeiro, batizei-o de Pútin; o segundo, Minsky; o terceiro, Gorky e o caçula, Trotsky. Centenas de visitas a Loba recebia cada dia. Super alimentada, amamentar foi-lhe uma diversão. Ninguém passava da porta do depósito, ninguém podia tocar seus cachorrinhos. Medidas de higiene e segurança!


Vinte dias mais tarde, comoção no Colégio. Um descuido e roubaram-lhe o primogênito. As zeladoras, mães, com lágrimas nos olhos, prognosticaram o pior. Ele morreria certamente, pois sequer estava desmamado. Ladrão sem coração! Dias de investigações, ameaças de castigo e, depois, promessas de recompensa não trouxeram resultados. Com esforço superei o trauma, mesmo porque Minsky assumia o seu papel e a Loba não parou no tempo. Os três cresciam a olhos vistos.


Aos sessenta dias, mamãe Loba tirou sua matilha da toca, pra explorar o pátio. Era um sábado, não havia crianças por perto. Em fila indiana, as orelhas empinadas e os rabinhos enroscados, sinais de boa saúde, marcharam fidalgos. A hierarquia! Que espetáculo! De longe a Loba observava os empregados orgulhosos. Era o primeiro fruto do canil. Funcionava!


Ai, mas, deixa estar que, entre tantos cães, eu tinha também uma Scooby-Doo recém-parida, a medonha da Sissy, mãe negra e desajeitada de nove bichos ainda feios. Os lobinhos descreveram uma curva no gramado e vieram em direção ao canil e, no caminho, deram com os pratos da Sissy; instintivamente puseram-se a lambê-los. Foi quanto bastou. Sentindo-se ameaçada, ela endoidou e, saltou o cercado de onde estava, para atacar. Abocanhou o mais afoito e o jogou pra longe. Todo o canil desatou num só latido frenético e horrorizado. Tudo foi tão rápido; que impotência! Quando, pois, ralhei com a cadela doida, ela se recolheu a amamentar sua ninhada.


A Loba tinha acudido feita um raio, mesmo assim, tarde demais. Aí, ganindo, ela lambeu e relambeu o seu bebê com o crânio destroçado e já sem vida. Custou trabalho levá-la pro refúgio com o que sobrou de sua prole. Dei ordens relativas à sepultura aos funcionários desconsolados. Olhei pra Sissy, nem sinal de remorso. Oh natureza cega! Acabou-se a graça. Sai a um centro comercial para espairecer. Mas tudo estava tão cinzento. Meu peito, naquela tarde, oprimiu-se horrivelmente.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011